quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Insaciedade

Após a espera,
Após a paixão,
Após o tesão,
e após falhar inúmeras vezes
querendo fugir desse querer,
finalmente o beijo, o toque, o contato,
a respiração no pé do ouvido,
os corpos grudados,
um desejo, enfim, suprido...

Ao menos era essa a ideia.

Mas os lábios, abraços, saliva,
não foram suficientes,
e só serviram pra despertar mais vontade​.

Meu corpo contra o seu,
o beijo violento,
que parecia querer me devorar,
sua língua na minha,
me dando ideias,
despertando fantasias...
o lugar proibido
instigando a libido...

Esqueço a razão,
Esqueço quem sou,
inebriada por seu hálito provocante
e seu falso ar inocente,
que me deixam doida,
babando, sem rumo,
implorando um pouco mais do seu sabor.

Dê-me sua língua, sua boca, seu corpo,
pois de mim você já tem o que quiser.
Estou entregue ao seu jogo,
entorpecida no seu charme de mulher.

Passe em casa

Na noite passada
você me ligou,
achei estranho não mandar mensagem.
Disse que estava num bar aqui perto,
só de passagem,
e que, pra não passar vontade,
talvez passasse aqui.
Nem lembro que hora era,
mas respondi: "pode vir!".

Ao chegar não disse nada,
apenas beijou-me
com sua boca esfomeada,
elevando em mim o apetite.
De repente, a casa inteira
encheu-se com a sua presença,
com a fumaça do seu cigarro
impregnada nas cortinas
e seus gemidos ecoando pelos vãos silenciosos.
Naquele instante, o mundo podia ser nosso.

Mas dois cigarros depois,
com a fome já saciada,
beijou-me com carinho,
se dizendo cansada
e simplesmente se foi.

Eu, que sou gulosa,
demorei a dormir.
Ainda queria mais
(Eu sempre quero mais).
Mas a vida não nos deu asas
para nos trancarmos em gaiolas.
Se tem asas, é natural que você voe.
Se tenho asas, tenho mais é que voar.

Aceito a despedida
sob a chama de um careta,
Acalmo meu corpo
pra que a alma não enlouqueça.

E assim, espero o sono chegar,
pois amanhã é outro dia,
um novo dia pra voar.
Vamos nos ver novamente
e novos voos alçar.
Mas se a vontade apetar,
Você sabe onde passar.


domingo, 19 de novembro de 2017

Inadequado

Da poesia que só aflora de um coração em farrapos
tento refazer meus pedaços,
sobrevivendo de versos mal rimados.

Você partiu e eu fiquei.

Você era a luz que iluminava meus dias,
até aquela despedida.
Você era perfeita pra mim, mas eu
já não cabia em sua vida.

Receio

Não é segredo que te quero,
já não consigo disfarçar o meu desejo.
Me pego lembrando de pequenos gestos,
do jeito que você mexe no cabelo,
dos olhares tímidos que dirige a mim
quando pensa que não estou vendo,
do seu sorriso sem jeito
quando eu te deixo sem graça...

Não seria difícil eu me perder nessa ilusão
Porque você tem esse misto
de doçura e sedução
e o seu sorriso delicado, sua voz suave,
afastam de mim as dores de outras vidas.

Receio ao pensar até onde essa paixão me levaria
Porque você me faz rever alguns conceitos,
Me faz gostar até dos seus defeitos,
e por isso tenho medo.

Prefiro ficar na minha.

O amor da minha vida

Bruna tinha o sorriso,
Maria tinha o olhar,
Clara gostava de filmes,
Paula de viajar...
Procurei em todas elas uma forma de ser feliz.
Ana contava histórias,
Lara sabia ouvir...
Amei-as por igual, cada uma do seu jeito,
como amei a tantas outras.
Mas aquilo que eu buscava
ainda faltava em meu peito.
A vida me mostrou,
aos poucos e sem destreza,
que o amor da minha vida
só podia ser eu mesma.

Efêmero


Compreendi com muito esforço
que o amor não pode agregar a ideia de pertencimento.
O amor é um sentimento efêmero,
ele aflora, se edifica,
nos fortalece e modifica.
Mas o amor também muda,
acaba, se transforma.
E a alegria e plenitude daquele sentimento tão perfeito
se convertem em uma dor dilacerante
que nos rasga a alma e estraçalha o peito.
Mas o problema não é o amor, é o conceito.
O amor não é como a gente viu
nas histórias que o cinema nos contava.
O amor não é ser, o amor é estar.

Mentira

Mentira se eu negar o meu desejo,
mentira se eu lhe negar da boca o beijo
quando o corpo me estremece de paixão
e nem consigo disfarçar a emoção.

Mentira se eu disser que eu não ligo,
que não ouvi soar o alarme de perigo
quando pra mim o seu sorriso se ascendeu.

Mentira se eu disser que é pra sempre
e que sei como vai ser daqui pra frente.
Só sei que sem você o meu tempo já não passa
e que vivo a lamentar minha desgraça.

Mentira se eu disser que ainda minto,
se eu tentar negar o que eu sinto.

Mentira se eu disser que não me envolvo,
que não senti-me encher de algo novo
e que não ando a sonhar com o beijo seu.

Mentira se eu disser que não foi nada,
mentira se eu disser que estou bem.
Mentira e admito, envergonhada,
que me entrego sem pensar no que convém.

Sou uma romântica incurável
e me perco no seu charme de mulher.
Eu sou uma romântica incurável,
especialista em querer quem não me quer.

Imperfeito


Hoje o nosso amor é um verbo
que só se conjuga no passado
e eu tento aceitar a realidade,
buscando no futuro do presente
alguma forma de esperança,
já que pra nós está desfeito, acabou, não tem mais jeito,
e todas as alegrias e sonhos que tivemos
ficaram pra trás, com tudo que vivemos,
Sob o silêncio inquietante de um pretérito imperfeito.

Abismo


Parece que nunca vou aprender com meus erros!
Após tantas dores, tantos problemas,
e mesmo diante de horizontes tão mais favoráveis,
ainda me pego sonhando com um certo olhar
que não tem coragem de me encarar,
ainda me pego querendo provar os beijos
da boca que me confunde.

Ai de mim por querer alguém assim!

Seus olhos são como um convite ao abismo
e, mesmo sabendo dos riscos,
basta sentir-me por eles tocada
que esqueço quem sou,
não sei mais de nada,
só penso em poder tocar seu corpo
até você sentir na alma
como é intenso o meu desejo. 

Conselho



Não se deixe levar, ingênuo coração,
pela presunção de bondade
que você enxerga nas pessoas.
Todo mundo mente,
até as pessoas boas.

Não foi, pois, por acreditar
que você se perdeu
tantas e tantas vezes?

Sossega coração,
vai buscar alguma paz.
Esquece as emoções,
Não queira amar jamais.

Que neste mundo, coração,
não há lugar para você,
Não há lugar para o amor,
é tudo em vão.

Os beijos que prometem-se eternos
são efêmeros e levados pelo vento,
como folhas que se vão pela calçada,
como animais vadios à procura de alento,
como moedas a rolar de mão em mão.

Contradição

Eu devia nem ligar,
Não devia ficar pensando em você.
Nunca tivemos nada
E acho que nunca vamos ter.

Eu devia seguir em frente,
Devia só esquecer,
Eu não devia te querer tanto.
Não convém esse querer.

Eu devia mudar o foco,
Eu devia deixar pra lá,
Devia não procurar,
Devia nem me importar​.

Mas eu me importo.

sábado, 18 de novembro de 2017

Perda



​De todas as perdas que já tive na vida, a que mais doeu foi a perda do amor próprio, quando me vi rastejando e implorando por um resto de sentimento qualquer que pudesse me dar alguma mínima esperança para continuar vivendo.

Nunca imaginei ouvir da boca que tantas vezes me jurava tanto amor que esse mesmo amor já não existia, que a casa, os sonhos, os planos e a família que tivemos já não existiam.

Eu já sofri muito por amor, mas nunca imaginei que nenhuma dor pudesse doer tanto. Nunca uma desilusão me fez ter medo de amar novamente, mas dessa vez foi diferente. Eu não quero sentir mais nada que me leve outra vez a essa sensação horrível de abandono. Tenho medo de não saber mais amar.

De todas as coisas que você tirou de mim quando se foi, a pior de todas pode ter sido a capacidade de ver beleza e verdade nas pessoas e de acreditar que vale a pena se arriscar por amor. Perder você já e bem difícil, mas perder a minha essência por alguém que não soube me amar é uma dor indescritível.

Sem futuro




















Não temos futuro
e isso é fato.
Nós não temos futuro,
mas não impede
que eu me pegue
sonhando com seu beijo,
desejando o seu toque outra vez,
ignorando os sinais da realidade. ​

Transformação




















Chegar em casa e encarar o vazio
dia após dia, em silêncio,
sem coragem de encarar-me no espelho,
sem conseguir entender meus sentimentos,
sem ninguém para aquecer-me do frio,
sem conseguir traduzir o que penso,
cansada desses olhos vermelhos,
sucumbindo em meus próprios lamentos.

Experimento agora novas emoções
e começo a afastar sua figura,
evitando o eufemismo das doces ilusões
tentando não morrer nessa tortura
de não saber mais quem eu sou,
de não querer ser mais ninguém,
de alimentar desejos tolos,
de esperar por quem não vem.

Então, na manhã de uma sexta-feira sombria
encarei a casa vazia,
sequei minhas lágrimas,
olhei-me no espelho
e decidi gostar também de mim.

Já não me assombra a promessa das coisas que dizia.
Você tornou-se tão fria!

Por isso, meu bem, hoje acordei diferente,
ignorando essa dor do nosso passado-presente .

O que não convém a gente deixa pra trás,
pois não se pode contar com quem não quer mais.

Desatei minha venda,
a esperança está morta.
Tudo mudou, você me esqueceu.
Só não se arrependa,
já não me importa.
Tudo mudou, inclusive eu.

Passarinho




















Agora jaz em mim a esperança
Mutilada por suas palavras frias.
E naufragando em suas desculpas vazias
Começo a te apagar da lembrança.

Outrora quis o beijo,  o afago, o afeto...
Aqueles foram tempos de ilusão.
Já não há amor em meu peito, agora sou só deserto,
Ausentou-se de mim o encanto da paixão.

Mas não, a emoção não está morta,
Ela apenas se transformou,
Entristecida por suas palavras, por tudo que me negou.

E agora tanto faz, já não importa.
Você, passarinho, bateu asas, me esqueceu.
E foi assim, por me esquecer, que de fato me perdeu.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Desconhecido




















Quem é você que me chama pelo nome?
Que me chama pelo sangue,
Mas nunca me viu dormir?
Onde esteve quando eu te quis?
Em todos os lugares,
menos aqui.

Quem é você que me encara?
Que me atira palavras?
Quem é você pra falar de mágoas?

Onde esteve quando eu te chamei?
Longe demais
para me ouvir.

Quem é você que eu não conheço?
Que não sabe quem sou?
Quem é você que eu não mereço?

Onde esteve quando eu te amei?
Ocupado demais
pra se importar.

Quem é você, se eu nem sei seu gosto?
Nem reconheço seu rosto?
Quem é você pra me julgar?

Onde esteve enquanto eu chorei?
Indiferente demais
pra reparar.

Quem é você pra querer falar de indelicadezas?
A vida inteira eu desfrutei das migalhas da sua frieza
Quem é você pra me cobrar?

Onde esteve quando eu cresci?
Onde esteve quando eu mudei?
Onde estava você quando eu te esqueci?
Por que não veio enquanto eu te amei?

Quem é você pra falar de saudade?
Esteve sempre em suas mãos,
Não faltou oportunidade.

Onde você esteve que eu nunca te vi?
Cadê os abraços que eu nunca senti?
Cadê seu carinho? Cadê seu amor?

Quem é você pra falar do que sou?
Não foi você que o meu sono velou.
Não foi você, você nunca ligou.

Quem é você pra me olhar assim?
Me diga, tente explicar,
Quem é você,  enfim?
E por que quis estar
em qualquer outro lugar
a não ser perto de mim?

Adormecido


Tenho feridas que sagram dentro de mim
no mais obscuro silêncio de minha alma,
feridas que desconheço o tamanho
ou a gravidade,
uma parte de mim
que esteve adormecida por muito tempo,
mágoas guardadas de coisas das quais eu já nem lembro.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Desabafo sobre depressão e ansiedade: precisamos falar sobre essas coisas



Pouca gente sabe, mas o ano de 2016 foi bem difícil para mim, e não apenas pelas tragédias coletivas. Na verdade, meu problema não é algo de agora. Durante toda a minha vida tive que lidar com a depressão e a ansiedade. Durante muito tempo eu me odiei por causa disso. Não gosto muito de expor meus problemas pessoais para muita gente, mas levando em consideração que foi um texto assim que me ajudou no ano passado, resolvi falar sobre este assunto na esperança de poder também ajudar outras pessoas, nem que seja no sentido de explicar melhor a depressão e ansiedade, não por uma ótica profissional, clínica ou de senso comum, mas na perspectiva de quem vive esses problemas.


Vamos lá

Primeiramente, quero falar do meu processo de aceitação. Eu sempre tive vergonha de dizer que tinha essas doenças (sim, depressão e ansiedade são doenças) por acreditar no falso consenso de que você só é depressivo porque você quer, pois se você disser pra si mesmo que não tem problema nenhum, o problema simplesmente deixa de existir. Mas não é bem assim que as coisas são. No ano passado eu li muito sobre esse assunto e tive acesso a relatos de pessoas que passavam pelas mesmas coisas que eu. Sempre soube que não era a única pessoa no mundo a sofrer com depressão, mas ao ver como os sintomas e os problemas que as outras pessoas enfrentavam eram parecidos com os meus, pude perceber que meu caso não era tão único. Ao ver depoimentos de pessoas que aprenderam a lidar com isso tive a esperança de que o mesmo pudesse acontecer comigo. Talvez se eu buscasse mais informações sobre o problema e partilhasse de mais experiências de outras pessoas, eu aprendesse e compreendesse melhor o que acontecia comigo. Não estou aqui para dar uma fórmula mágica de como superar a depressão, isso não existe. Mas para mim, aceitar que eu tinha um problema foi um passo muito importante. Compreender esse problema foi mais importante ainda.

O que mais me ajudou foi ver que várias pessoas que lidam com isso experimentam os fracassos, passam por inúmeras tentativas frustradas, desistiram por um tempo, todas essas coisas são comuns. O desafio é tentar ser persistente na busca por alternativas, mesmo quando sua mente e o seu corpo dizem não. Já tentei um monte de coisas que deram certo por um tempo, mas que depois se tornaram inúteis, e tudo bem, muita gente passa por isso. Já passei longos períodos sem nenhum sintoma da doença por perto e, de repente, ela volta do nada ou quando estou passando por alguma situação delicada. E tudo bem. São fases. Faz parte. Não sei quantas outras pessoas em todo o mundo estão passando por essas mesmas coisas. Às vezes nos sentimos mais dispostos e vamos procurar algum tipo de ajuda, outras vezes acreditamos que nada poderá nos ajudar. Mas a coisa mais importante que é preciso saber nesses momentos é que eu não sou a única, que o problema não sou eu, que isso não é coisa só minha, nem é algo que eu possa controlar. 

Em segundo lugar, é importante falar sobre o tratamento com o auxílio de medicamentos. Há um preconceito muito grande em torno dessa questão. Eu mesma me vi várias vezes reproduzindo o discurso de que não queria ficar dependente de remédios. Se você tem uma doença e se nega a tomar algum medicamento que possa ajudar no tratamento é mais difícil conseguir algum progresso. A depressão e a ansiedade, diferente do que ouvimos muitas vezes, não são frescuras, não são falta do que fazer, não são falta de uma louça pra lavar ou de um terreno pra capinar. São doenças, e doenças sérias. Não devemos menosprezar a gravidade desses problemas. Ninguém condenaria a atitude de uma pessoa que sofra de uma doença crônica como a diabetes e tome remédios todos os dias para controlá-la, ninguém vai chegar pra essa pessoa e dizer que ela é viciada. Então, tomar remédios não é sinônimo de fraqueza.


Tratamento com ajuda de medicamentos

Outra coisa a entender é que os remédios funcionam de maneira diferente para cada pessoa. Mesmo que meu problema seja muito similar ao seu, o remédio que funciona pra mim não necessariamente servirá pra você. Por isso é importante não desistir na primeira tentativa fracassada. Infelizmente, é preciso experimentar diferentes drogas até encontrar uma que funcione, que tenha menos efeitos colaterais, essas coisas. 

O período do tratamento também varia. E se esse período precisar ser mais longo para algumas pessoas é normal, pois cada organismo reage de um jeito. Eu, por exemplo, costumo tomar remédios por um determinado período de tempo até me sentir melhor e ir gradativamente suspendendo o uso. Aí alguns tempos depois os sintomas voltam e preciso retomar o tratamento. Para outras pessoas, pode ser necessário o uso ininterrupto. É sempre bom ter um acompanhamento médico para essas coisas. Eu só entendo da minha própria experiência, e pra mim, o mais importante quanto a isso é não me sentir culpada por precisar tomar esses remédios e tentar ver esse tipo de tratamento como qualquer outro.


A relação com as outras pessoas

Dito isto, gostaria de falar sobre o que mais dificultou minha forma de lidar com essas questões durante toda a minha vida: as outras pessoas. Estou escrevendo esse texto pensando em poder compartilhar minha experiência com pessoas que passam pelo mesmo que eu, mas também como uma forma de alcançar as outras pessoas. Muita gente acha que sabe tudo sobre depressão, que é uma questão de força de vontade e que só depende de você virar o jogo. Como se não bastasse todos os problemas que a depressão coloca na sua vida, você ainda tem que lidar todos os dias com pessoas que ficam te dizendo o que fazer, que acham que estão te ajudando, mas na verdade só pioram tudo. São incontáveis críticas, incontáveis conselhos infalíveis e incontáveis certezas sobre coisas que essas pessoas não têm nenhuma noção do que são. 

É muito difícil ter que ouvir que sua doença é invenção, que se você passa o dia inteiro na cama e não tem ânimo nem para se alimentar é por preguiça, é porque você escolheu ser assim. É muito difícil ter que ouvir alguém dizendo “saia dessa cama, vá viver, vá fazer uma caminhada”, como se fosse só uma questão de levantar e agir. Nunca passa pela cabeça dessas pessoas como pode ser difícil em alguns momentos a simples tarefa de acordar, sair da cama e tomar um banho ou fazer alguma refeição. É difícil ter que ouvir a todo instante que “você não está se ajudando”, “você não tem determinação”, “se você disser pra si mesmo que não quer se sentir assim, você não vai se sentir assim”. É difícil ouvir as pessoas dizerem que quem demonstra tendências suicidas só está querendo chamar a atenção, como se isso fosse um capricho. É lógico que a pessoa quer chamar a atenção, quer saber que é importante para alguém, saber quem se preocupa com ela. Não se deve menosprezar esse tipo de coisa. Infelizmente, vi pessoas que imploravam por atenção finalmente desistirem e cometerem suicídio. 

Compreendo que a maioria das pessoas que fazem essas coisas não fazem por mal. Mas se você quer mesmo ajudar alguém, deixe as generalizações de lado e procure se informar mais sobre o assunto. Encher a pessoa de conselhos vazios que jogam nela toda a culpa pelo problema não é um modo de ajudar. Pelo contrário, isso só piora as coisas, só faz com que a pessoa depressiva se sinta ainda mais incapaz e incompetente. Ninguém chegaria para uma pessoa com câncer e diria: “se você quiser, você fica bom. Vá andar, saia de casa, pratique um exercício, pense positivo e quando você menos esperar o problema terá desaparecido” ou “se você disser pra si mesmo que você não tem câncer, se você quiser mesmo, você não terá mais câncer”. Quando transferimos o discurso para o modo de lidar com o câncer percebemos o quanto ele é absurdo. A depressão e a ansiedade são doenças como qualquer outra e não vão desaparecer só com a força do pensamento. Então, se você quer mesmo ajudar, pare de julgar, pare de achar que é uma questão de força de vontade. 

“Ah, mas eu já tive depressão e foi assim que eu me curei”. Não, você não teve depressão. É importante diferenciar depressão de momentos delicados, de traumas e outras situações. Se você nunca foi depressivo e então passa por um grande trauma, a perda de ente querido, por exemplo, e passa algum tempo na bad, mas depois vai retomando sua vida e as coisas vão voltando ao normal, você não pode dizer que teve e se curou de uma depressão. Você passou por um trauma e superou ele. Isso é totalmente diferente. A depressão não precisa de motivos para aparecer. A ansiedade também não. 


Ansiedade 

Sobre a ansiedade especificamente, é importante não confundir sofrer de ansiedade com estar ansioso. Não conto as vezes que falei pra alguém que tinha ansiedade e a pessoa perguntou o porquê de eu estar ansiosa. Essa ansiedade é diferente daquela ansiedade de quando você tem algo importante para fazer, como quando está prestes a ir a um show de uma banda de que você gosta muito e fica pensando naquele assunto específico. A ansiedade que eu sinto me tira o sono, me deixa sem ar com medo de morrer a qualquer instante, ou de perder alguém que amo, me dá coceiras e tremores nas pernas, me deixa inquieta sem eu saber o motivo, me dá palpitações e aceleração no coração, não permite que eu me concentre em tarefas simples, como ler um livro, por exemplo, me faz ter medo do escuro, de dormir sozinha, pensar que vou morrer por qualquer sintoma de qualquer doença besta, sentir qualquer problema e ir direto no google pesquisar sobre um milhão de doenças e acreditar que tenho a mais grave de todas, ter uma preocupação excessiva em relação a tudo, ter comportamentos compulsivos, achar que nunca faço nada certo ou que sempre está faltando alguma coisa, ficar revivendo situações tristes ou embaraçosas. 


Como ajudar?

Então, em vez de ficar criticando as pessoas que sofrem com esses problemas ou sufocando-as com um milhão de soluções prontas, se quiser realmente ajudar, mostre que você se importa com ela, tente escutar quando ela estiver disposta a se abrir e também saiba respeitar seu silêncio. Tente entender os problemas que ela enfrenta e não desista dela se ela fracassar. O abandono é muito comum na vida de quem tem ansiedade e depressão.

Já testemunhei muitas vezes (e já passei por isso também) casos em que as pessoas que tentavam ajudar alguém com depressão desistem e vão embora. É o velho “você é complicado demais”, “você é uma pessoa destrutiva”, “você tem muita energia negativa”. Perder pessoas é sempre difícil, ainda mais quando elas simplesmente desistem de você. Entendo que não é fácil conviver com alguém tão instável, mas é sempre bom tentar compreender que a pessoa precisa de você e que não é culpa dela estar sempre se auto sabotando, ou sendo pessimista. A depressão é um desafio pra quem sofre com ela e pra quem convive com essas pessoas. 

Sei que devo ter esquecido de falar sobre um monte de coisas e que não vai ser esse texto que vai mudar a vida de alguém de uma hora pra outra, mas estou feliz por poder compartilhar essas coisas.  E digo sinceramente que compreender o que eu sinto foi a coisa que mais me ajudou em todos esses anos.