sexta-feira, 4 de abril de 2014

Quando a boemia se foi


Eu costumava passar a maior parte do meu tempo me odiando, repudiando a minha existência. Eu realmente não estava bem. Na verdade nunca estive, mas naquela época eu estava pior.  Nos tempos de bebedeira e vagabundagem eu costumava encher a cara e esquecer os meus problemas, conseguia sorrir. Era uma época relativamente boa. Eu saia com uns amigos, ia a alguns bares, tomava todas, dava vexame, chorava, vomitava, mas eu fazia alguma coisa. 

Qualquer loucura é melhor que o tédio.

Agora era diferente, eu não saia, não via ninguém, quase não tinha amigos, nunca tinha dinheiro pra sair, não conversava com ninguém fora do meu ciclo profissional. Comprava umas cervejas e ia pra casa beber sozinha assistindo televisão. O máximo de interação que tinha era com estranhos pela internet, talvez pessoas com vidas tão desgraçadas como a minha.  Noite após noite, eu voltava pra casa no final do dia, passava no supermercado e comprava umas cervejas, me embriagava sozinha vendo séries de TV, depois ia dormir. Acordava tarde, me alimentava mal, e saia pro trabalho, pra quando voltar, repetir tudo.

O trabalho, aliás, era um dos meus maiores tormentos. Eu não gostava daquele lugar, não gostava daquela gente, mas fingia gostar, por que eles não tinham culpa, ninguém tinha culpa. Eu era o problema.  Eu não sabia me relacionar, não queria. E o trabalho me obrigava a fazer isso.

Eu me irritava frequentemente, e por pouca coisa. Nunca tive paciência para coisas chatas, e tinha menos saco ainda para as pessoas. 

Em sua maioria, as pessoas costumavam ser fúteis, estúpidas ou burras, ou as três coisas ao mesmo tempo. Eu não queria perder meu tempo com esse tipo de gente. Meus amigos estavam longe, então eu preferia ficar em casa e me embriagar sozinha. Se quisesse falar com alguém, eu falava com meus gatos, estes sim, criaturas maravilhosas, autênticos, livres e carinhosos. Enquanto eu tivesse meus gatos, não fazia questão da companhia de ninguém. 

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