terça-feira, 10 de agosto de 2010

Fortaleza Imaginária

Em uma cidade, em um país, e em um planeta completamente imaginários, num lugar no qual o resto do mundo não poderia jamais entrar, havia uma garotinha sonhadora e assustada. Ela era alegre, gostava de música, de desenho animado; de refrigerante não. Tinha amigos, vizinhos, colegas, primos... Gostava de todos eles, porém, nunca permitiu que nenhum deles entrassem naquele seu mundo. Na maioria das vezes, gostava de ficar sozinha, brincava e criava suas histórias, passava horas perdida em seus pensamentos, sonhando.
Com quatro anos, descobriu as letras, aos seis descobriu as palavras, e encontrou nelas grandes aliadas para suas aventuras. Lia as histórias daqueles livros e se imaginava ali, no lugar daqueles personagens. Não demorou muito para que criasse suas próprias aventuras, embora não as escrevesse...
Em seus contos, ela resolvia todos os problemas à sua volta, assim superou a perda de pessoas importantes, superou a timidez, a vergonha... Ela sempre arrumava um jeito de se esquivar da dor quando estava naquele seu mundo.
Foi lá que ela guardou seus segredos, também foi lá o lugar que ela escolheu para se refugiar da tristeza... E para suprir a ausência de quem sempre esteve muito próximo e nunca pode estar presente.
Seu mundo era seu escudo, e muitas vezes sua prisão.
Os anos foram passando, a menina foi crescendo, e as paredes que sustentavam os muros de sua fortaleza foram ficando mais frágeis. Agora, ela não era mais criança, não tinha mais a mesma vida, mas já gostava de refrigerante. Cedo a vida lhe forçou a ser corajosa, mas foi movida pelo desejo e não pela coragem, que decidiu se arriscar e ir atrás do que sonhou. Seu mundo somente já não era o bastante para lhe satisfazer, sabia que precisava concretizar as coisas que buscou, no entanto, aquele mundo nunca perdeu seu significado, embora não vivesse mais nele, era pra ele que ela fugia sempre que estava em apuros, era nele que ela se acalmava quando estava aflita: botava uma música, lia um livro, escrevia algumas palavras, e já sentia a alma mais leve.
Era mesmo uma figura diferente aquela garota! Amadureceu muito cedo, mas fazia questão de preservar aquele encanto. No começo, achava que recorria àquele mundo porque se sentia sozinha. Aos poucos foi criando muito elos, era muito sentimental, preservava todas as sinceras amizades, e não eram poucas... Ainda assim, aquele mundo lhe servia de abrigo. Nunca se importou com esse fato, nunca deixou que ninguém violasse os portões de sua fortaleza, não por falta de confiança, não era isso... Era apenas um capricho seu... Um segredo, uma ilha, como um diário que se escreve sem palavras.
Eis que então se apaixonou! Aí, tudo muda de contexto, aos poucos foi deixando que o amor invadisse sua vida e consumisse todo o seu tempo, parecia que finalmente as barreias haviam se rompido, sentia que pela primeira vez, alguém havia conseguido se inserir naquele seu delírio colorido.  No início, se negou, quis fugir, quis evitar. Mas foi inútil, logo se rendeu àquele ser de olhar singelo.
Amava como jamais havia amado, e como poucas pessoas foram capazes de amar, como poucos poetas foram capazes de traduzir... Entretanto, tudo isso lhe havia feito refletir acerca daquele seu pequeno universo, chegou a acreditar que com a entrada de outra pessoa, o sentido daquilo tudo havia sido alterado, agora para ela era como se aquele não fosse mais seu universo, mas um universo conjunto, uma coisa compartilhada, que só teria razão de ser através da ligação daquelas duas almas.
Não demorou para que as diferenças aparecessem, e nos momentos em que quis fugir, não conseguiu, seu refúgio de toda a vida, havia se desfeito em essência. Sentia que a única maneira de resgatar aquele lugar era através daquele amor; lutou por ele, se opôs a tudo e a todos, acreditou, se iludiu, se magoou.
O mesmo ser que há pouco, muito pouco, lhe acariciava a face, era o ser que agora lhe falava de outro corpo, outros beijos, um outro amor... O mundo caiu sobre seus ombros, olhou ao seu redor e viu tudo que guardou naquele mundo desde cedo indo embora... O espaço que sempre foi só seu, e que tanto quis dividir com alguém, era agora a terra de ninguém, porque tudo ali só fazia sentido nessa hora, com a presença do ser amado.
Quis fugir não conseguiu, quis gritar não teve voz, quis ser forte, mas chorou e implorou... Lágrimas de tristeza que se misturavam com as lágrimas da decepção, os motivos de sua dor se confundiam... Por tempos sofreu daquela forma, no peito um punhal em chamas lhe rasgava a carne e o osso quando via seu amor com outro alguém.
Tudo estava então perdido... Ela não tinha mais a pessoa que completava o sentido de seu mundo, logo, seu mundo também não fazia mais sentido. A tristeza se alojou em sua vida, os dias tornaram-se mais longos, os livros não eram mais interessantes, não conseguia se concentrar para ver um filme, a única coisa em que pensava era no quanto queria de volta aquele amor para poder reconstruir sua Fortaleza.
O tempo foi passando e a menina descobriu nos amigos uma chance para recomeçar, sorria, saía, tomava refrigerante, mas quando voltava para sua casa, tudo recomeçava: a dor, a saudade, o silêncio; até os desenhos animados haviam perdido a graça.
Se pôs a pensar por muitas noites, sabia que seu grande amor não iria voltar... e agora nem o seu esconderijo tinha mais... Passou a lembrar dele todos os dias, a recordar as coisas que tinha vivido naquele lugar. Foi então que encontrou no meio da bagunça de sua vida, alguns CDs, DVDs, livros, fotos e filmes antigos que estavam guardados há tempos, porque não eram do agrado de seu amor. Inundou-se em lágrimas novamente ao olhar para tudo que havia renunciado em nome daquela paixão e ao ver que todo aquele esforço foi em inútil.
Sentiu raiva de si mesma por ter sido tão ingênua. Empunhou a caneta e decidiu escrever suas lamentações em uma carta suicida, não porque havia perdido o seu amor, mas por ter deixado que aquele mundo se perdesse por causa de alguém que nunca foi capaz de lhe amar verdadeiramente. Era a perda daquele lugar especial que lhe feria, a essa altura já havia descoberto que o ser que ela tanto amou, não passava de uma pessoa suja e covarde, um ser amargo e incapaz de amar. Essa constatação lhe feria de forma fulminante.
Antes de finalizar sua despedida, lembrou mais uma vez daquele mundo, das coisas que fazia nele, do quanto ele lhe fazia bem. Lembrou também de como ele havia mudado depois daquele amor, de como seu sentido se alterou. Foi então que percebeu o grande engano que estava cometendo: Seu mundo não estava completamente perdido, ele só estava abandonado.
Durante todo o tempo em que esteve abrindo mão das coisas que gostava para agradar o seu amor, ninguém havia conseguido se encaixar no seu mundo. A pessoa que ela julgava ter finalmente rompido os portões daquela fortaleza, sequer havia encontrado o caminho para ela. Não era o amor dela que havia entrado naquele mundo, era ela que tinha saído dele. E a chave para voltar estava em suas mãos. Ela podia agora recompor sua vida, voltar para seu universo e retomar todas as coisas que considerava perdidas. Descobriu então que enquanto fosse capaz de sonhar, de sentir, de amar, aquele mundo jamais se perderia, pois ele era uma extensão imaginária do seu próprio ser.

4 comentários:

  1. Feliz daquele que consegue, por meio das palavras, expulsar do coração aquelas coisas que se insistem em ficar dentro dele.

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  2. Oi Ellen sou eu Lucas adorei a historia espero que a continuaçao dela tenha um final feliz!

    Te amo Ellen estou aki para todo sempre para oq der e vier My Frynd!

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  3. Ellen, falei que o texto tava enorme, mais é tão atrativo que li rapidinho...quero falar com vc sobre o texto depois!
    xeru

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  4. Fico feliz por saber que mesmo com preguiça de ler, vocês acharam o texto atrativo, e conseguiram degustar minhas palavras. Grata, Muito Grata.

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